BOM DIA!!!!
Hello peoplessssssss...Amo os
artigos do Gaudêncio Torquato, por isso vou postar um aqui.Leiam com atenção...
Malabaristas no picadeiro
Gaudêncio Torquato
Incrível, porém verdadeiro. O
passado mais remoto encontra-se com o presente para rezarem, juntos, a mesma
oração eleitoral. Basta ver Dilma Rousseff e José Serra caprichando nas
recomendações feitas por Quinto Túlio Cícero ao irmão, o grande tribuno e político
Marco Cícero, no ano 64 a.C., quando este se preparava para enfrentar Catilina
na disputa pelo consulado de Roma. Quinto ponderava no final de uma longa
carta: "Seja mais cuidadoso na última etapa e na conclusão de suas tarefas
e atividades, a fim de que o terceiro ano de seu governo, como o terceiro ato
de um espetáculo, dê a impressão de ter sido o mais perfeito e belo." É
exatamente isso que a ministra-chefe da Casa Civil faz neste momento de apoteose
da era Lula, ao perambular por Estados e inaugurar obras, mesmo algumas
inacabadas. Quando o governador paulista se esforça para fazer o balanço de sua
administração, mostrando ações acabadas e também projetos iniciantes, segue o
ritual daquele que até merece o título de primeiro profissional de marketing
político da História.
Entre os conceitos de política
como a arte do possível e a arte de tornar possível o impossível, os nossos
atores optam pela segunda hipótese. O apanhado dos últimos dias dá conta de um
acervo capenga: instalação de um PAC-2 quando o primeiro PAC registra 54% de
obras que nem saíram do papel; inauguração de maquete de ponte; eventos em
torno de pedras fundamentais e até de "demolições"; reinauguração
(pela quarta vez) de linha férrea; inauguração de obras que voltam a ser
canteiros e de outras a serem reinauguradas pelo futuro presidente da
República. É evidente que postulantes a cargos majoritários se esmeram na
pintura final dos governos que comandam ou integram, cada um decorando as fachadas
com tintas de perfeição e beleza, no intuito de atrair, desde já, a atenção do
eleitorado e, mais adiante, fisgar seu voto.
A performance de candidatos para
ganhar a simpatia das massas faz parte da liturgia da política, principalmente
em ciclos eleitorais. Não raro, porém, ultrapassa os limites do bom senso,
adquirindo tons farsescos. Na tentativa de cooptar a atenção dos conjuntos
sociais, motivando-os ao engajamento eleitoral, arruma-se um roteiro que
implica torrente de frases de efeito, retumbante prestação de contas, com
descrição de programas e obras. Acordo tácito se instala entre Justiça
Eleitoral e competidores, a primeira impondo pequenas multas por dribles na lei
- que proíbe campanha agora - e os segundos assumindo a cara de pau. Os exageros
são frequentes. Oceânica distância se estabelece entre fato e versão. A
manipulação ocorre também por meio de vitimização. Ou de matreirice. Ao
ironizar punição imposta por ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE),
Lula desculpa-se, ao inaugurar obras do PAC em Osasco (SP), por não poder dizer
o nome de sua candidata, incitando o público a gritar seu nome.
As estratégias de dissimulação
avançaram na esteira do chamado marketing político, ignorando limites éticos e
regras voltadas para preservar o maior patrimônio do ator político, que é sua
identidade. Desde Collor, com a exacerbação de atitudes - voar em avião
supersônico, fazer cooper diário arrastando uma fileira de jornalistas -, os
nossos governantes passaram a frequentar os salões espalhafatosos do marketing.
O que diria Jânio Quadros, cheio de autoridade, ao receber o conselho de um
marqueteiro sobre como se vestir e falar? Imaginem Tancredo Neves, matreiro e
com domínio total de política, orientado a estampar o sorriso e a jorrar besteiras
que tanto nos acostumamos a ouvir nesses tempos de "preamar de
nulidade", de que nos fala o bigodudo Nietzsche ao retratar a miséria
mental de seu tempo.
Os estratagemas subjacentes à
massa propagandística têm o claro objetivo de cooptar a adesão das massas. Se o
foco é o obreirismo faraônico - o volume monumental de obras -, que parece
agradar em cheio aos grupamentos eleitorais escasseiam menções a valores,
princípios e ideários. Moral, ética, zelo, respeito, disciplina, fidelidade e
solidariedade são termos que se afastam da esfera política para se refugiar nas
organizações não-governamentais. E assim a política espetacularizada vai
sufocando os pulmões que a oxigenam. Sob essa nova ordem, as massas são
submetidas a peças deprimentes.
O que fazer para resgatar o
grande discurso? Voltar a Quinto Túlio. Que aponta outra recomendação, logo no
início da carta ao irmão: "Que cidade é essa? Que cargo eu quero? Quem sou
eu?" Três perguntas fundamentais. Se os candidatos responderem a essas
singelas perguntas, sem firulas, ajustarão o foco do discurso dizendo o que
pensam e como governarão o País. Sem malabarismos.
* Gaudêncio
Torquato, jornalista, é professor titular da USP e consultor político.
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